"É preciso preparar-se para mais elevados conhecimentos, só neste pensamento pode a nova consciência aproximar-se da humanidade"

(Mestre El-Morya)


domingo, julho 15, 2012

Alvorecer da Consciência

Levei um certo tempo para me sentir razoavelmente confortável em escrever sobre o tema de hoje, até porque, é um tema muito hermético e que só alguns buscadores conseguirão entender verdadeiramente. O fato de eu querer torna-lo público é resultado de perguntas que já vi espalhadas na internet sobre o assunto e, como eu tenho alguma informação sobre ele, resolvi compartilhar. Entretanto, é um tema profundo, tem a ver com processos iniciáticos da consciência e não posso afirmar que eu tenha total domínio sobre ele, porém, vou passar minha visão baseada nas experiências que eu já vivi até aqui.

Muitos de vocês já devem ter visto o filme “Cidade dos Anjos”, com Nicolas Cage e Meg Ryan. Não vou aqui analisar ou descrever seu enredo, apenas pegar uma parte dele que me parece estar ligada, ou ter sido inspirada, por um mito estudado nas escolas de mistério, que pode ser chamado de “Noite das Trevas” ou outros nomes similares. De fato, estudos herméticos têm muitos mitos que precisam ser desvendados conforme vamos avançando na senda. Na realidade, os mitos são como mapas simbólicos, baseados em arquétipos que, conforme vamos buscando entender seu significado através da experiência mística, eles vão se revelando e mostrando se estamos ou não no caminho certo. Esses mitos também, por estarem baseados em simbolismos arquetípicos, nos fornecem muitos insights durante as meditações, descortinando mundos vastos de reflexão e experiências interiores que nos fazem avançar mais rapidamente nos caminhos do espírito. Mas voltando ao filme “Cidade dos Anjos”, há um momento que mostra os anjos na praia, de frente para o alvorecer, aguardando a chegada do sol; também é mencionado que eles ouvem uma música inebriante que os eleva espiritualmente, ou seja, como se o contato com o sol lhes causasse um novo alento de vida. Se nos fixarmos especificamente nesta cena, considerando todos os elementos simbólicos que ela contém, por si só já temos um amplo espaço para reflexão, como, por exemplo, a água (representada pelo mar) que tem relação com os sentimentos, o sol que tem relação com a luz divina, ou o próprio Deus de muitos povos e religiões, a música elevando os espíritos, como um fluído divino que nos toca sem vermos, as pessoas voltadas para o alvorecer, esperando pela luz que ilumina o mundo da manifestação, ou seja, sinais de iluminação da consciência. Com essa cena em mente e procurando vivenciá-la, somos levados a pensar que o momento da iluminação deve ser algo parecido com isso, uma sensação de libertação, de paz, de vida, de calma, de pureza.

Mas e antes do alvorecer, o que há? Daí o mito da “Noite Trevosa”, pois antes do dia, há a noite. Esse mito causa uma certa dúvida e inquietação em muitos estudantes, pois, assim como uma profecia, ele nos parece muito assustador até que passemos por ele, sendo que, ele é assustador justamente porque ainda não o vivenciamos e não conseguimos decifrá-lo. Uma profecia é assim, é como um sinal de algo que não temos como saber o que é, nem quando vai acontecer, mas a descrição que ela contém muitas vezes parece assustadora e incompreensível, só sendo desvendada depois que acontece e, mesmo assim, muitos ainda questionam se existe mesmo a profecia ou se seria apenas uma associação de ideias que não tem realmente conexão. Além disso, quando falamos de noite e de trevas, somos evocados a diversas programações mentais, espirituais e até mesmo físicas (memória de DNA), relativas aos perigos e sentimentos contidos em uma noite negra. Veja que nossa experiência com noites bem iluminadas é muito recente, pois toda nossa memória ancestral nos dá conta de noites vividas nas florestas, cidades sem iluminação, ausência de luz elétrica, etc., portanto, em nossa programação mental, o escuro é momento de alerta e autopreservação. Some-se a isso os arquétipos religiosos que associam as trevas aos demônios, seres deformados e canibalescos, cujo objetivo é aprisionar nossas almas e vampirizar nossa vitalidade. Enfim, a “Noite Trevosa” nos causa medo e esse é um dos primeiros simbolismos importantes desse mito.

Apesar de alguns irmãos interessados verdadeiramente em ajudar os outros, procurando dar explicações lógicas, objetivas e até simplistas para os buscadores que ainda não passaram por essa etapa de seu desenvolvimento místico, não há como explicar a experiência da passagem pela “Noite das Trevas” e do resultado que isso vai causar na psique do adepto, pois é uma experiência, não um conhecimento; o máximo que se pode fazer é explicar o processo e oferecer pistas de onde isso vai mexer internamente em cada um. Pode-se também fazer uma reflexão sobre essa etapa e aumentar os benefícios tanto para quem já passou, como para quem está passando, pois cada consciência tem seu plano de desenvolvimento e o que é enfatizado para alguns, passa desapercebido por outros, sendo que a troca de experiências sempre é profícua.

A sugestão que nos é trazida em relação à “Noite Trevosa” é que ela é um período de tribulações e provas. Depois de passar por esse período, eu tenho uma visão um pouco diferente, pois tribulações e provas confundem-se com expiação em algumas doutrinas, com significação de sofrimento, sendo esse termo muito desgastado e mal interpretado por diversas religiões. Falar de sofrimento sempre é complicado, pois muitos mestres já o estudaram a fundo e encontraram seus caminhos para compreendê-lo e superá-lo. Pessoalmente, acho que cada termo tem sua vibração e seu significado intrínseco, mesmo que muitos digam que são sinônimos e querem significar a mesma coisa. Em uma rápida pincelada da minha noção sobre esses termos, expiação está associada ao mito do calvário de Cristo, sendo que, segundo as próprias palavras Dele, Ele é a própria expiação e a libertação que dela resulta, então, tenho minhas dúvidas se é sofrimento. Para mim, sofrimento é uma experiência do ego, relacionado a apegos, perdas e paixões, portanto, não pode ser expiação, pelo menos aquela que é uma experiência libertadora e Crística. Tribulações são obstáculos que nos auxiliam no desenvolvimento consciencial e provas são os pontos de verificação que nós mesmos nos impomos, mesmo que inconscientemente, para avaliar nosso domínio sobre determinado aspecto da vida. Quem generaliza se afasta do discernimento e quanto mais consciência temos, mais discernimento podemos manifestar, ou seja, discernimento e consciência andam de mãos dadas.

Tema profundo... veja que todos os elementos apresentados sempre nos suscitam inquietação. Pegando o que já foi sugerido até aqui e misturando, temos que antes da iluminação haverá um período de expiação, tribulação ou provas que, na opinião do vulgo, é sofrimento; que para se libertar é preciso se crucificar. Cuidado com conclusões rápidas, pois a lógica da alma não tem suas bases alicerçadas na lógica da matéria e do ego. Essa impressão ruim, especialmente para aqueles que ainda não viveram o processo, é justamente o artifício que o ego usa para evitar que você busque o domínio da vida, ou seja, o ego está tentando afastar você disso, pois o ego quer ser o rei e não o filho sentado ao lado do Pai (reflita sobre isso, pois essa é uma das lições mais importantes que o buscador precisa se conscientizar).

Não há resposta fácil antes de se passar pelo processo, cada um tem que vivenciá-lo do seu jeito. Mas, como disse acima, dá para dizer o que se vai enfrentar e porquê, ou seja, é possível acrescentar alguns racionais para auxiliar sua consecução, mas não dá para explicar o que vai acontecer ao seu coração. Antes de prosseguir, quero deixar claro que eu não me considero um mestre iluminado e isso é mais uma pista sobre o processo da “Noite Trevosa”. Passamos por várias noites escuras em nossa vida e, para cada uma delas, nós alcançamos um grau a mais na iluminação da consciência. É lógico que umas são muito mais importantes que outras e muito mais iluminadoras, mas o mito serve para todas elas. Haverá uma derradeira? O mito do calvário de Cristo sugere que sim, assim como muitas narrativas dos verdadeiros Mestres Ascensos. Se essa tese é verdadeira, então, saiba que este que vos escreve está longe de ser um Mestre Ascenso, mas também não acho que é um cego guiando outro, pois já consigo ver algumas coisas e, se você chegou até aqui, imagino o mesmo para você. Posso afirmar que já passei por esse processo no que tange à experiência conduzida pelos meus estudos em escolas de mistério para essa encarnação. Também posso afirmar que já passei por algumas “Noites das Trevas” menores e que, muito provavelmente, ainda vou passar por outras, portanto, o que vou transmitir aqui é o meu entendimento dessa experiência à luz dos ensinamentos das escolas iniciáticas que participo.

Um pequeno parênteses aqui para podermos entender um pouco mais sobre a consciência: se analisarmos nossa consciência da forma como ela está constituída hoje, podemos afirmar que ela é muito limitada. Waldo Vieira associa amplitude da consciência, ou um estado mais ou menos desperto, com a capacidade de interação entre as diversas consciências existentes, independente do seu nível evolutivo, desde as mais básicas até as mais universais, tendo como ponto de partida a nossa própria consciência. Esmiuçando esse conceito um pouco mais, se nos colocarmos na posição de uma entidade com uma consciência muito desenvolvida, poderíamos interagir com a consciência de uma flor, de um inseto, de um animal ou de um ser humano de forma a nos comunicarmos com esses seres diretamente da fonte para o destino, ou seja, saberíamos o que esses seres estão sentindo ou pensando, pois podemos perceber seu interior; poderíamos mesmo incutir uma ideia ou vontade dentro desses seres, uma intuição. Voltando um pouco no exemplo do filme “Cidade dos Anjos”, os anjos podiam “ler” os pensamentos das pessoas, portanto, entende-se que eles tinham a consciência mais desperta para poderem interagir com essas informações, compreendendo o que significavam e sem perderem seu amor. Voltando agora para nossa limitada consciência humana e prosseguindo com esse conceito de Waldo Vieira, quem de nós pode dizer que consegue sequer interagir diretamente com a consciência do seu animal de estimação? Quando digo interagir quero dizer se comunicar integralmente com ele, entendendo o que ele sente e sabendo transmitir para ele a sua vontade. Pois é... nesse mundo devem haver uns poucos que conseguem, muito poucos; e o mais estranho é que, provavelmente, nossos animais de estimação devem nos considerar como anjos para eles. Há pessoas que leem pensamentos e, para mim, isso significa sim que a consciência dessas pessoas é um pouco mais desperta, pois elas já conseguem interagir de uma forma um pouco mais direta com os demais seres, pelo menos, os do mesmo reino.

Voltando ao tema principal, podemos dizer que escuridão evoca sombras e medo. Uma consciência que não consegue enxergar a outra sofre de um tipo de cegueira consciencial. De fato, vivemos em meio às nossas próprias sombras conscienciais, mal conseguindo discernir o que acontece dentro do nosso próprio ser. Temos medo de nós mesmos, temos medo da libertação, temos medo da iluminação. Quando tentamos adentrar nossa própria consciência, encontramos diversas sombras negras. Se ter a consciência desperta significa comunicar-se diretamente com outras consciências, devemos estar em um sono profundo, pois mal conseguimos nos comunicar conosco mesmo. Não seria esse o significado da “Noite Escura”? Se adentrarmos uma floresta à noite, nos sentiremos desamparados, enfrentando as sombras e os perigos de uma floresta escura; isso nos coloca frente a frente com nossos medos. Adentrar a “Noite Trevosa” é adentrar nossa consciência, de frente para esses medos e para os perigos do ego, a floresta escura. Para conseguirmos atravessar essa noite, primeiramente, precisamos acreditar no alvorecer, trazer no âmago a certeza de que em algumas horas a luz vai deflagrar o horizonte e dissipar as trevas. Segundo, precisamos saber que nosso maior inimigo é nosso próprio medo, que faz com que nos isolemos e consideremos todos como inimigos, inclusive nossas próprias sombras. Quem tem medo, não tem amor; reage agressivamente e destrutivamente. Quem tem medo, não acredita que está amparado, não tem fé, não se harmoniza com a “floresta”, não escuta a voz da verdadeira consciência interior. Quem tem medo, foge das suas sombras, de si mesmo. A expiação da “Noite Escura” é o enfrentamento dos seus medos, a luta do seu Eu Interior para iluminar sua consciência. Terceiro, precisamos saber que não estamos sozinhos na noite; assim como no filme onde todos os anjos se reuniam na praia antes do alvorecer, há muitos “anjos” acompanhando você nessa “floresta”; para ouvi-los, você precisa se abrir e aqui vale uma menção a outro filme, “A Profecia Celestina”, onde um dos insights é você se abrir para essa nova realidade. Quarto, você precisa saber qual é a arma mais eficaz para você combater o medo; essa arma é o Amor. Você pode enfrentar todos os “perigos” da “Noite Trevosa” através do Amor e da Fé. Quinto, a “Noite Escura” não é uma prova, uma tribulação ou sofrimento, é um processo de expansão da sua consciência. Quando um esportista treina para superar seus limites, ele vai expor seu corpo a uma carga além de sua capacidade atual para poder melhorar seu desempenho, isso causa dor, algumas lesões, exige esforço, mas o esportista não considera isso sofrimento, ele sabe porque está fazendo isso e qual objetivo quer alcançar; de fato, na minha opinião, esse é o verdadeiro significado de expiação, ou seja, é expor-se a um esforço que parece além de sua capacidade, um verdadeiro sacrifício pessoal, uma entrega por um objetivo claro e divino que será libertador. A expiação de Cristo foi ser o cordeiro de Deus e seu mito foi entregar-se em sacrifício pela salvação da humanidade, a mais trevosa e libertadora de todas as noites.

Não tenha medo da sua experiência de “Noite das Trevas”, pelo contrário, vá em direção a ela. Entregue-se aos seus mistérios. Aceite seus desafios. Viva sua expiação divina. Ao final de toda noite, por mais negra que ela seja, a luz do Grande Sol Central vai colorir o horizonte, a brisa morna do mar vai acariciar sua face, a música doce do vento vai exaltar sua consciência e seu coração vai se abrir, desabrochando a rubra rosa da sua Alma.

Fiquem na Paz Profunda do Pai.
Hugo De Paula F.R.C.


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