"É preciso preparar-se para mais elevados conhecimentos, só neste pensamento pode a nova consciência aproximar-se da humanidade"

(Mestre El-Morya)


quinta-feira, abril 17, 2003

Histórias de Mestres e Xícaras

Duas grandes dificuldades do ser humano são transcender seus hábitos e compreender as diferenças. Isso acontece por questões naturais, uma vez que o cérebro humano funciona baseado nos hábitos das células neurais e na experiência pessoal do ser. Mesmo o aprendizado é feito através da repetição, ou seja, criando-se o hábito.

De qualquer forma, muitos dos métodos, doutrinas e linhas de pensamento que buscam a evolução espiritual citam essas dificuldades como passos do processo. Pode ser, afinal são conhecimentos bem experimentados pelos buscadores, mas temos que ter em mente que esse plano é mutável e mesmo as mais consolidadas descobertas do homem sofrem evolução. Nesse particular, algumas doutrinas muitas vezes parecem intransigentes, talvez por influência da tradição e da cultura. Tradição é algo importante e que deve ser preservado, mas não de forma inquestionável, pois como todos os sistemas materiais, está sujeita à evolução, transformação e mutação. Não quero dizer com isso que não devemos trabalhar na lapidação de nossos hábitos e conceitos, mas sim que pode ter aparecido outras formas de atingir o mesmo resultado e que devemos estar abertos para elas, em suma, transcender os limites do próprio conhecimento, mesmo daquele que sabidamente funciona.

Deixe-me contar uma história tradicional do oriente para aprofundarmos nesta questão:

“Um professor universitário foi visitar um mestre Taoísta para conhecer o Tao. O mestre gentilmente colocou uma xícara vazia a sua frente e serviu-lhe chá. A xícara encheu e o mestre continuou servindo chá, transbordando o recipiente e derramando o conteúdo. Vendo isso, o professor alertou ao mestre de que a xícara estava cheia. O mestre então disse – Você está como esta xícara, cheio de idéias e conceitos. Como posso eu mostrar-lhe o Tao sem que você esvazie primeiro a xícara que está em sua mente?”

Essa história mostra muito bem o quão apegados somos aos nossos conceitos e hábitos, além do quão difícil é para alguém apresentar seu ponto de vista ou ensinar alguma coisa em função disso. O mais interessante é que, ao contrário do que as linhas de pensamento que apresentam-na acreditam, esta parábola também mostra o apego do mestre às suas instruções, pois, se é mestre, espera-se que aceite as diferenças. Por que precisamos esvaziar a xícara da nossa mente para apreender o que o mestre tem a ensinar? Não poderíamos fazer isso de forma cumulativa, acrescentando o ponto de vista do mestre e desenvolvendo nosso próprio caminho à iluminação? O que precisamos é não ter apego ao chá que está em nossa xícara e estarmos preparados a transformá-lo em um chá melhor, ou descartá-lo caso ele realmente não prestar. Em vez de pedir para esvaziar a xícara, o mestre pode compreender essa diferença, encontrar onde está a manifestação divina nela e ajudar seu aluno a identificar essa manifestação para poder potencializá-la. É como se o professor fosse visitar o mestre carregando seu próprio chá e o mestre dissesse para ele:

“Caro amigo, sua mente e seus conceitos são como o chá que você trás, pode ser amargo ou doce, aromático ou não, bom ou ruim para você. Como qualquer chá, ele é feito com água pura e é ela que você precisa conhecer. De qualquer forma, para conhecer a água pura, você pode tentar encontrá-la nos diversos chás que você provar. Para isso, você precisará de várias xícaras onde serão colocados chás diferentes. Sugiro que você prove-os separadamente e depois tente compará-los. Não importa se você gosta ou não gosta, tente achar a água pura que compõe todos eles, pois ela está lá. Se você preferir, podemos fazer mais fácil. Conheço uma pequena nascente da água pura e, em vez usar os chás, você pode conhecê-la diretamente. Mas para isso, você terá que deixar todas as suas xícaras aqui, inclusive esta que estou servindo, pois sua preocupação com elas atrapalhará sua caminhada até lá.”

Não importa o caminho que você segue para encontrar Deus. Todos eles são parciais em sua manifestação material e por mais que sejam métodos eficazes, são apenas isso, métodos; meios para sair de um ponto e chegar a outro. Pratique-os, mas compreenda que há diversos caminhos que funcionam para diversos tipos de pessoa e todos eles têm em sua essência a intenção divina. Você pode até não querer conhecê-los, mas respeite-os e aceite-os como você deveria fazer com a própria consciência divina, pois ela estará lá. Se preferir, estude-os, mas não esqueça sua bagagem pessoal, pois é a sua tradição. Apenas esteja preparado para trazer evolução para ela. De qualquer forma, não dê tanta importância a tudo isso, pois o que realmente importa é estar na nascente, bebendo da água pura, junto a Deus. Depois que você chegar lá, tudo não passará de um livro com a história do seu ser, que habitará na biblioteca do nosso lar espiritual.

Um comentário:

Fabiano Andrade disse...

Muito bom. Por que perseguimos os variedades de sabores se podemos beber direto da fonte!

Parabéns.